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26/01/2021 13:00

Novela Hamilton e o reino de Mercedes segue patinando

Escrito por Wagner Gonzalez
Jornalista especializado em automobilismo de competição

Foto: Mercedes

Obstáculos na renovação do contrato de Lewis Hamilton e a equipe Mercedes


Os brasileiros que se lembram da última temporada de Ayrton Senna na McLaren, em 1993, identificam claramente uma reedição da renovação de contrato entre ambos na negociação que embrulha a continuidade ou não de Lewis Hamilton na equipe Mercedes. Naquele ano o brasileiro acabou acertando sua participação no campeonato na base da corrida a corrida a um valor inédito para a época: US$ 1 milhão por GP. Para uma equipe tão organizada como a Mercedes e administrada com mão de ferro por Toto Wolff, chega a surpreender como um contrato tão importante se arraste por quase um ano. Valor e duração do contrato representam os maiores obstáculos nessa novela na qual não faltam vilões, há um ou dois mocinhos e alguns valores que adicionam obstáculos em um roteiro que tem data específica para terminar, como o próprio Wolff admite:

“A única data-limite que existe (para resolver esta questão) é o GP de abertura da temporada, no Bahrein.”

Enquanto o dia 28 de março não chega, advogados da Mercedes e de Lewis Hamilton digladiam-se através de reuniões via internet para obter as melhores vantagens a cada lado. Se até outubro as vantagens eram praticamente privilégio do inglês, nem mesmo o fato de ter sido condecorado com o título de “sir” amainou o revés provocado pela atuação de George Russell na penúltima etapa de 2020 e a decisão da fábrica alemã em cortar gastos mundo afora.

Nos últimos dias, Wolff, que recentemente foi identificado como infectado pelo covid-19, declarou à emissora austríaca ORF que “nunca usou e nunca usará George Russell como forma de pressionar Lewis Hamilton”. Por mais que isso possa ser verdade, é difícil levar tal afirmação 100% a sério diante das implicações a presença ou a ausência de um heptacampeão mundial implica em uma equipe de F1.

Primeiro ponto: ter Hamilton em um dos seus carros valoriza os contratos com os patrocinadores, parceiros e fornecedores de tecnologia. Para que estes financiadores do projeto capitalizem seus investimentos é preciso definir uniformes dos pilotos e do pessoal da equipe (o que inclui desenhar e fabricas macacões, camisetas, bermudas, jaquetas, calçados, etc) para cerca de 250 profissionais, criar, produzir e aplicar a programação visual dos carros de corrida e de transporte e do motorhome, planejar, orçar e programar ações de marketing e publicidade ao redor do mundo e vários outros itens. É óbvio que ter a presença de um heptacampeão mundial significa cobrar preços astronomicamente mais alto do que os praticados com sua ausência.

Igualmente é óbvio que num período em que o grupo Daimler está reduzindo sua força de trabalho e fechando fábricas ao redor do mundo, entre elas a de Iracemápolis (interior do estado de São Paulo), fica difícil justificar o salário anual de dezenas de milhões de dólares para um piloto, não bastasse o fato de ser um valor maior do que o pago ao próprio presidente da empresa. Junte-se a isso o fato de que a equipe Mercedes de F-1 existe como uma unidade de negócios e, como tal, deve produzir lucro e não gerar prejuízo aos seus três acionistas: o grupo Daimler, Toto Wolff e Sir James Arthur Ratcliffe, executivo-chefe da Ineos, uma das patrocinadoras da equipe.

Diante de tudo isso ainda soa estranho o trabalho da equipe durante a penúltima etapa de 2020, quando George Russell substituiu Lewis Hamilton, largou em segundo (atrás de Valtteri Bottas), liderou a corrida e só não subiu ao pódio porque o time montou pneus errados em seu carro, um erro crasso e próximo do inacreditável para os padrões de eficiência pregados e praticados por Toto Wolff.

É difícil crer que Lewis Hamilton não continue acelerando um carro da Mercedes na F-1. Difícil, porém, é diferente do impossível e a cada dia que passa sem que as partes entrem em acordo com relação à duração e ao valor do contrato, menos distante fica o horizonte de uma temporada sem o maior vencedor da história da categoria. A ausência do campeão tampouco seria algo inédito na história do time que desde 2014 domina a categoria: em 2016 o alemão Nico Rosberg anunciou que abandonava as pistas dias depois de conquistar o título da temporada.

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