Dia 10 de dezembro de 2015. Essa data vai ficar marcada na história do kartismo brasileiro como o dia em que foi destruída a pista do Kartódromo Internacional Júlio Ventura, em Eusébio (CE).
Às 7h20min recebi uma ligação de um dos pilotos que se mobilizava em frente ao kartódromo na tentativa de barrar a entrada das máquinas na pista cearense. Com seus carros até que conseguiram ganhar um pouco mais de tempo, mas não o suficiente para que fosse dado prosseguimento ao trabalho de retirada do asfalto no traçado de 1000 metros que viu passar pilotos como Rubens Carrapatoso, Renato Russo, Danilo Dirani, Sérgio Jimenez, Olin Galli, André Nicastro e o tricampeão brasileiro, que é cearense, Marcus Vinícius Kinho.
Desde junho de 2014 havia a especulação de que o palco de um dos mais disputados campeonatos estaduais, que envolve 38 pilotos e emprega diretamente algo em torno de 42 pessoas, poderia dar espaço a um empreendimento imobiliário, já que o kartódromo está localizado em uma das mais valorizadas áreas da cidade do Eusébio.
Na área em torno do kartódromo vários condomínios foram criados. Um deles teve casa vendida na planta por R$ 180.000,00 e que hoje não sai por menos de R$ 650.000,00. O kartódromo é de propriedade de um grupo empresarial que atua em várias áreas, sendo a principal delas a venda de veículos, e detém concessionárias das marcas Fiat, GM, Renault, Nissan, Kia e Honda.
Em contato com Francisco Ventura, um dos diretores do grupo, e o advogado Valdetário Mota, que representa o grupo empresarial, os dois lembraram que há 20 anos a família Ventura construíra o kartódromo após a destruição da pista da Avenida Leste-Oeste, em Fortaleza, e que há mais de três anos recebiam reclamações de moradores vizinhos incomodados pelo barulho dos karts. Assim, já havia sido comunicado, segundo eles, à direção do Clube de Kart (Cekart), do interesse da retomada da área e da paralisação das atividades do kartódromo e sua destruição.
Hoje, munidos de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC), emitido pela Prefeitura Municipal do Eusébio, através da Autarquia do Meio Ambiente (AMMA), foi iniciada a destruição da pista. O TAC, assinado por Celso Henrique Martins Rodrigues, presidente da AMMA, em sete de dezembro de 2015, estabelece que seja suspensa qualquer atividade automobilística no terreno, com a retirada no prazo de 10 dias da pista existente no terreno.
Francisco Ventura, que não quis gravar entrevista, disse que se compromete em encontrar junto com os administradores do kartódromo uma solução para a construção de nova pista, tanto que mencionou a existência de um termo de autorização de realocação do Kartódromo Júlio Ventura para o Autódromo Internacional Virgílio Távora até a solução definitiva, para a qual se compromete em ajudar. O documento, datado de 29 de dezembro de 2014, é assinado pelo então Secretário de Esporte do Estado do Ceará, Antônio Gilvan Silva Paiva, e que, na próxima terça (15), será realizada reunião com representantes dos pilotos e do clube de kart para tratar do tema.
Em contato com a Assessoria de Imprensa da Secretaria do Esporte do Estado do Ceará, fui informado de que o atual secretário, Jeová Mota, tem realizado contatos com a empresa Vicar, que organiza a Stock Car, para que esta apresente um documento com o objetivo de pautar uma possível reforma do autódromo para receber a competição, mas que não poderia responder sobre o termo de uso da pista para realocar o kartódromo porque o secretário estava participando de reunião, mas que, nesta sexta (11) responderia ao site Carros e Corridas. A assessoria informou ainda que hoje o Autódromo Virgílio Távora é administrado pela Federação Cearense de Automobilismo, por sessão datada do ano de 2003.
A notícia do andamento da retirada do asfalto tomou conta da cidade de pouco mais de 50 mil habitantes, que se orgulha em ser conhecida como cidade motor, e levou o ex-prefeito Acilon Gonçalves, uma das lideranças políticas mais influentes da região, a se manifestar contrário à ação do dia de hoje. Acilon recebeu a reportagem do site Carros e Corridas e disse entender que os proprietários têm todo o direito de reivindicar a área. No entanto, segundo Acilon, se apressaram em demasiado para reavê-la, já que havia uma movimentação para se conseguir um outro local onde será construída a nova pista.
Acilon lembra que os pilotos criaram uma associação e estudavam várias possibilidades, sendo uma a ser construída em um shopping no município de Caucaia, e outra no próprio Eusébio, por sessão de terras do Grupo M Dias Branco, que daria à prefeitura do Eusébio terras vizinhas ao Autódromo Virgílio Távora para construção do kartódromo, sem interferir no atual traçado.
“Na minha avaliação, os proprietários reais do terreno resolveram recuperá-lo e mobilizaram todos os instrumentos que possivelmente estivessem sendo incomodados pelo equipamento, pelo kartódromo. Ao meu ver, o secretário de esporte do Estado, através de um TAC que vi entre ele e a família proprietária do terreno, assumiu que daria, que já estava assegurado um local dentro do autódromo para fazer o kartódromo, e que esse seria feito. Eu preciso que isso precisa seja cumprindo, que o secretário de esporte aloque recurso, que faça a pista, que com isso ele faça o kartódromo no centro automobilístico que é o autódromo. Nós estávamos nos mobilizando junto à prefeitura do Eusébio para que houvesse a doação de terras de empreendimento do grupo M Dias Branco para expandir o autódromo e fazer o kartódromo lá. Eu já tinha até falado com o Stênio (Diretor do Cekart), mas houve essa aceleração dos proprietários históricos do terreno, induzindo a AMA em extinguir a pista antes de ver o que o governo do estado prometeu fazer, que é o kartódromo lá no autódromo, que eu não acredito no cumprimento dessa promessa. Eu entendo que como a assinatura do secretário de Estado ele já deve ter inclusive recurso destinado a fazer esse kartódromo lá, se não ele não iria assinar um TAC desse tamanho, então, com certeza, já deve ter todos os mecanismos legais, financeiros para fazer esse kartódromo dentro do autódromo para que se aja de tanta rapidez em destruir uma pista que tem tantos anos de uso”, disse Acilon.
Após ouvir Acilon Gonçalves, a reportagem do Carros e Corridas voltou a fazer contato com Francisco Ventura para que comentasse as declarações, mas a ligação caiu em duas tentativas após contato e em outras duas ele não atendeu ao telefone. O site decidiu publicar as declarações de Acilon, mas deixa claro que todos os citados têm o mesmo espaço para darem suas versões.
A reportagem também tentou ouvir o presidente da AMA, Celso Henrique Martins Rodrigues, mas este não atendeu as ligações. Em contato com a assessoria de imprensa da Prefeitura do Eusébio, reiteramos o interesse em ouvir o dirigente, mas até às 20h desta quinta (10), Celso Henrique não havia retornado o contato com a assessoria.
Também procurada pela reportagem, a direção do Clube de Kart não quis emitir opinião. Já o presidente da Federação de Automobilismo do Estado do Ceará, Haroldo Scipião, por email disse que lamenta o ocorrido e esperava que o clube conseguisse outro local antes do fim da pista. “A FCA lamenta o ocorrido, tínhamos conhecimento de um processo que estava sendo negociado entre os proprietários do kartódromo e o Clube de Kart para junto com o Governo do Estado do Ceará conseguirem um outro local para um novo kartódromo. Hoje fomos surpreendidos com essas máquinas demolindo tudo e abalando com o Esporte no Estado do Ceará. Infelizmente a FCA não pode fazer nada a não ser apoiar o Clube de Kart para buscar novos investidores e tentar construir um novo kartódromo. Enquanto alguns empresários na Bahia, Paraíba e Pernambuco se mobilizam tentando construir uma praça de esporte desse tipo, os nossos aqui no Ceará querem demolir”, disse Haroldo em nota.